'MENTE MANUQUE' (com a mente e as mãos, lema do Boxe)
INTRUDER: A HISTÓRIA DE UMA CUSTOM
Desde os 15 anos, desejei ter uma moto custom. Na época, a
Yamaha Virago estava no sonho de consumo de pessoas como eu, quem no caso não
podia ter uma moto daquelas, fosse pelo preço, fosse pela própria idade.
O tempo foi passando, tirei carteira, esqueci meu sonho de
duas rodas por um tempo e finalmente comprei um carro, mas não demorou para que
o sonho retornasse com força total.
Porém, as motos custom que haviam no mercado eram apenas de
alta cilindradas e acima do que eu poderia pagar (na cidade onde eu morava).
Contentei-me em andar em modelos streets como YBR e Titan por um tempo, até que
finalmente surgiu no mercado modelos custom de baixa cilindrada acessíveis à
minha realidade.
Meu primeiro alvo foi a Mirage 150. Para mim, era a que mais
possuía o genuíno desenho custom, mas não achei em lugar nenhum do Brasil onde
eu pudesse compra-la. Passei então à Dafra Kansas 150, mesmo ciente de suas
deficiências sob a bela aparência, mas também não consegui adquirir porque eu
havia chegado no momento de transição para a sua sucessora: a Horizon 150, que
chegaria somente meses mais tarde.
Eu não podia e não queria esperar. E se tivesse esperado,
teria arrependido: arremedando um modelo da Harley-Davidson mais “racer”, a
Horizon não se mostrou exatamente a custom que eu queria. Restou-me a última
opção, que eu tinha procurado evitar: uma Suzuki Intruder 125, que eu tive que comprar
numa cidade vizinha próxima.
Intruder 2015, o modelo que comprei (fonte: Site Suzuki)
Intruder LC 250: Não encontrei referências dela no Brasil, parece que foi fabrica na Europa e EUA a partir de 2001. Custava a Suzuki criar a Intruder nessas linhas? Qual o problema com os latino-americanos?
Intruder LC 250: Não encontrei referências dela no Brasil, parece que foi fabrica na Europa e EUA a partir de 2001. Custava a Suzuki criar a Intruder nessas linhas? Qual o problema com os latino-americanos?
Meu problema com a Intruder era o seguinte: a Suzuki
anunciava uma moto custom, quando na verdade ela se parecia mais a um modelo
híbrido custom/street. Faço uma análise rápida do design da moto nesta
perspectiva:
·
O tanque de combustível, em forma de gota (mais
arredondado no novo modelo) poderia ser mais encorpado e achatado, como o da
Kansas, p.e..
·
As peças cromadas e o retrovisor são o que
redimem a moto.
·
A garupa parece a de uma moto ‘cargo’.
·
O escapamento é uma desgraça completa, como a
maioria das motos custom ou não, passando longe do conceito.
·
A distância entre eixos está aquém de uma moto
custom, uma de suas características principais, basta comparar com suas
similares.
·
Por fim, a suspensão traseira empina demais o
banco (o qual lembra mais uma street), terminando de descaracterizar a moto
como custom.
MUDANÇAS
Eu sempre fui da opinião que a gente deve jogar com as
cartas que temos à mão, e não lamentar as que não temos. Eu olhava essas
“falhas” na Intruder e conseguia enxergar nela a moto que eu sempre quis. É
como dizem, o escultor faz seu trabalho tirando o que é desnecessário, até
revelar a beleza das formas.
Beleza das formas – essa foi minha diretriz desde o momento
que minha moto desceu da caminhoneta da concessionária.
De cara, arranquei o
bagageiro ‘cargo’. O passo seguinte foi colocar um guidon custom, mas fui pego
de surpresa quando descobri que teria que aumentar os cabos para que o guidon
que comprei servisse. Então mudei de estratégia: preferi comprar ‘risers’ ou
levantadores de guidon (4 cm) do que fazer a complicada e cara troca de cabos.
O guidon da Intruder em si não é tão ruim do ponto de vista custom. Posteriormente
comprei um paralelo que por acaso era mais largo e melhorou ainda mais essa
parte.
Continuei comprando uma pedaleira avançada. Quando o produto
chegou, percebi que o lugar para por os pés estavam altos demais para que eu
pudesse manejar os comandos câmbio/freio traseiro. Então cerrei as pedaleiras
nas pontas, na peça que tinha um formato de ‘Ω’ invertido, e os encaixei em
linha reta, deixando-os praticamente no mesmo nível dos comandos, que eu passei
a acionar com os calcanhares. Juntamente com o guidon alto, essa pedadeira
avançada permite uma posição sentada mais ‘folgada’ de pilotagem, como é típico
das custom.
O passo seguinte seria rebaixar a suspensão traseira.
Pesquisei vários amortecedores menores que pudessem servir, até que encontrei
numa loja chamada ‘Race Custom’ um modelo com apenas 27 cm (o original da
intruder vai além dos 30 cm), próprio para Kansas e Mirage, de modo que tive de
adaptar o anel metálico inferior para encaixar na minha Intruder.
A moto se transformou. Como eu disse, a suspensão alta
demais descaracterizava o desenho custom, e com isso ela começou a chamar a
atenção, até porque a suspensão dianteira se levantou para compensar, ajudando
ainda mais o formato custom. Mas ainda faltava alguma coisa.
Então voltei minha atenção para o banco, que em nada lembra
uma moto custom. A princípio, tentei reduzí-lo, tirando cerca de 5 cm da parte
de trás. Ajudou, mas ainda lembrava mais um banco street.
Voltei às minhas pesquisas, até encontrar um kit de banco
solo de molas para Intruder. Era o que eu buscava, de cara me recordei das
Harley-Davidson, especialmente o modelo 1944 do exército americano, o meu
preferido. Adquiri o kit e pus a mão na massa. Serrei, furei, esmerilhei,
parafusei, e quanto terminei não acreditei no que estava vendo.
Detalhe molas/ conexão para banco carona.
Detalhe da rabeta após as alterações.
Foi a intervenção mais invasiva que fiz na parte estética da
moto até então. Eu tive que desmontar os cabos de pisca/farol para que dexasse
o para-lamas traseiro ‘clean’, realçando seu cromo. Foi algo positivo
especialmente porque eu descobri que o cabo do farolete traseiro estava quase
se rompendo – quando rebaixei a suspensão, não observei que o cabo estava
folgado, então o pneu o roía prensando-o contra o para-lamas. Reconstituí o
cabo, ajustei sua posição, e pintei a parte plástica do para-lamas, para que
ganhasse realce.
A minha moto virou ‘atração turística’. Todo mundo queria
saber que moto que era, de onde vinha, onde eu tinha comprado, elogios, etc. Eu
havia conseguido a ‘façanha’ de transformar uma simples Intruder num modelo “chopper
soft tail’. Sangue, suor e garra.
Da minha parte, eu estava contente, mas também acredito que
certas coisas sempre podem ser melhoradas, como é mostrado no filme “Desafiando
Limites” com Antony Hopkins e sua moto: é possível extrair o máximo de uma máquina, se você tiver as ferramentas e o conhecimento certo, e principalmente as pessoas certas para lhe ajudarem (mecânicos, vendedores, etc.).
Quem coloca um banco solo na moto é porque já tem a
consciência de que não vai carregar mais ninguém. No meu caso, os próprios
amortecedores já não eram ideais para mais de uma pessoa. Mas a ideia de
colocar um banco carona me perseguiu. Nunca se sabe quando pode ser necessário.
Não achei nada no mercado dentro ou fora da internet. Obstinado, eu não estava disposto a desistir, porque eu tinha recursos à mão: eu morava junto à oficina de marcenaria de meu pai, e tinha alguns materiais em casa que poderiam servir para fabricar um banco carona removível.
Após pesquisar alguns modelos de outras motos, encontrei o
modelo de banco carona suspenso de uma Harley-Davidson, que não recordo o
modelo. Parecia o que iria funcionar.
Achei alguns linguotes de ferro e aço, de diferentes
tamanhos e espessuras, e dentro da minha condição leiga sem esquecer o
bom-senso, testei um por um para ver se serviriam. Eu precisava de um aço com
têmpera não muito dura nem muito mole, que pudesse se deformar com a ação da
temperatura, trepidação e peso. Finalmente achei uma barra de aço espessa o
bastante com a dureza Rockwell que eu buscava – moldá-la, fazer o fundo do
banco, estofá-lo e perfurar os pontos de conexão com o banco solo não foram
problemas.
Todos poderão observar que o meu escapamento é todo preto
- apesar de continuar inadequado em
termos de design, o escapamento da nova Intruder veio até simpático, com
guarnição cromada e detalhe plástico em preto. Em função de uma queda, a parte
cromada ficou seriamente danificada na minha moto, então decidi pintar tudo de
preto – lixei o cromo e apliquei um preto fosco para altas temperaturas.
Satisfeito com o aspecto externo da moto, voltei meus
pensamentos para algo que até então eu não sabia – as motos Intruder a partir
de 2012 tiveram que se submeter ao “PROMOT 3”, até onde entendi, um regulamento
para controlar emissões de poluentes. O primeiro impacto foi que a moto perdeu
seus 12,5 cavalos ficando apenas com 11 cv, em função de um dispositivo chamado
PAIR, uma tecnologia que reprocessa os gases da combustão dentro do próprio
motor, e do novo carburador MIKUNI BS25.
Isso me preocupou: se por um lado a Intruder era uma custom
‘feia’, ela tinha o motor mais confiável e potente da categoria (125cc), e isso
para mim vinha acima de tudo, porque eu sou um biker estradeiro, e aprendi que
uma moto de baixa cilindrada pode levar alguém a qualquer lugar tanto quanto
uma de grande cilindrada – e com mais segurança, pois não há margem para abuso
de velocidade.
A minha primeira ação no novo ciclo de mudanças mecânicas
foi remover o PAIR. Desconectei as mangueiras, selei o buraco no motor com uma
plaqueta de ferro, e tampei os demais buracos com borracha.
Então passei ao carburador. Como o filtro de ar de espuma é
considerado o melhor para a respiração do motor, abri algumas frestas na tampa
da entrada de ar, e regulei o parafuso da mistura, esperando melhorar o
desempenho.
Mas tudo o que obtive foi aumento de consumo e um discutível aumento de resposta. Conclusão: o carburador MIKUNI BS25 de fato é limitado, mesmo porque ele possui outro complicador que eu só tomei conhecimento bem depois: ele não é totalmente mecânico, ele trabalha à vácuo com TPS (Sensor de Posição de Válvula de Borboleta).
As frestas na tampa da caixa de ar.
Mas tudo o que obtive foi aumento de consumo e um discutível aumento de resposta. Conclusão: o carburador MIKUNI BS25 de fato é limitado, mesmo porque ele possui outro complicador que eu só tomei conhecimento bem depois: ele não é totalmente mecânico, ele trabalha à vácuo com TPS (Sensor de Posição de Válvula de Borboleta).
Seja qual for a razão,eu sempre me lembro do Homem de Ferro,
sim, o herói. Nos gibis, Tony Stark nunca parou de incrementar suas armaduras
com novas tecnologias, mas sempre, vez por outra, elas o deixaram na mão e ele
teve que usar sua Mark I, a sua primeira armadura mecânica de aço. Vejam:
imaginem o consumo sobre a bateria de mais um dispositivo eletrônico que
funciona ininterruptamente, e pensem em toda vulnerabilidade que um circuito
eletrônico representa – a água é o primeiro deles. Numa moto com carburador
mecânico, se houver pane na parte elétrica, ainda é possível dar um tranco na
moto e andar por um tempo, a menos que a bateria esteja completamente
descarregada, mas no caso da nova Intruder, p.e., es ist kaputt, já era.
Eu havia percebido rapidamente que o BS25 possuía alguns 'defeitos': Com o tempo ele caía a marcha lenta. provavelmente pelo grande parafuso na vertical, o qual, mesmo com a mola de pressão, tende a se afrouxar com a trepidação.
Percebi também que o moto não tinha a mesma resposta rápida nas mudanças de aceleração que eu via nas outras motos, pelo menos considerando as marcações do contagiro, e entendi que este 'delay' só poderia ser em função no monitoramento eletrônico do carburador.
Finalmente, a moto simplesmente não dá partida no frio, mesmo usando o afogador, acionado através de uma alavanca inserida na caixa de comando esquerda do guidon, o qual demorava ou mesmo não aumentava a aceleração para aquecer o motor, o que não acontece com um carburador mecânico com afogador embutido.
Essas considerações sobre o carburador BS25 justificam o procedimento que vou descrever no título das alterações mecânicas a seguir.
Eu havia percebido rapidamente que o BS25 possuía alguns 'defeitos': Com o tempo ele caía a marcha lenta. provavelmente pelo grande parafuso na vertical, o qual, mesmo com a mola de pressão, tende a se afrouxar com a trepidação.
Carburador Mikuni BS25. No topo à direita, o parafuso de regulagem da marcha lenta.
A parte eletrônica do BS25.
Percebi também que o moto não tinha a mesma resposta rápida nas mudanças de aceleração que eu via nas outras motos, pelo menos considerando as marcações do contagiro, e entendi que este 'delay' só poderia ser em função no monitoramento eletrônico do carburador.
Outra coisa que incomoda são alguns ‘apagões’
inexplicáveis da moto, mas não dá para atribuí-los ao carburador ou à parte
elétrica – ou a ambos, já que estão conjugados.
Finalmente, a moto simplesmente não dá partida no frio, mesmo usando o afogador, acionado através de uma alavanca inserida na caixa de comando esquerda do guidon, o qual demorava ou mesmo não aumentava a aceleração para aquecer o motor, o que não acontece com um carburador mecânico com afogador embutido.
Essas considerações sobre o carburador BS25 justificam o procedimento que vou descrever no título das alterações mecânicas a seguir.
Assim, eu estava disposto a recuperar os 12,5 cv originais das
Intruders clássicas, e ter a confiabilidade de um carburador mecânico então dei
início a uma série de intervenções na parte mecânica.
Mas antes eu tinha outro desafio: o freio a disco. Em termos
de parada, é indiscutível a eficiência dessa tecnologia, mas em pilotagem,
simplesmente parar de uma vez nunca é um bom negócio.
O freio hidráulico é capaz de interromper imediatamente o
movimento da moto não importa a velocidade ou se é um ser humano que está sobre
ela. Ele simplesmente TRAVA a roda, mas não observa as leis da física: a moto
vai continuar em movimento (inércia), e, conforme a situação, vai fazer com que
os pneus derrapem e derrubem a moto no chão.
Foi o que aconteceu comigo. Minha moto não tinha 3.000 km
rodados, e eu já havia tido três quedas, em função de frenagens bruscas comuns
em trânsitos muito movimentados em que se é surpreendido com um risco de
colisão de repente. Pode ser que eu estivesse com o mau hábito de usar por
impulso o freio da frente, mas nas outras motos que tive com freio a tambor,
pelo menos, eu podia regular a intensidade do freio para não cair toda hora. De
resto, eu sempre achei que freio a disco deveria vir no freio de trás, onde
seria mais útil e seguro, mas vai entender a cabeça dos projetistas e
fábricas...
Eu só sabia o que estava na minha própria cabeça: o freio a
disco não mais me jogaria no chão. Após muito observar e pensar, vi que não havia
muito a fazer, a menos que eu estivesse disposto a desmontar a roda toda e
tirar o sistema, ficando sem freio. Mas eu precisava ainda do freio, eu apenas
queria que ele não travasse a roda e virasse a mesa de direção, o que acontece
em toda freada brusca na frente.
Foi então que, estudando a mecânica do freio, achei um ponto
de intervenção: a saliência do manete que acionava o pistão hidráulico que
fazia funcionar o freio. Com facilidade, removi o manete e esmerilhei a
protuberância até que ficasse num tamanho tal que o freio poderia funcionar mas
ainda deixar a roda livre. A medida foi um sucesso, e no mais, aprendi a
utilizar mais o freio traseiro.
A saliência que aciona o pistão do freio a disco limada (no centro). O manete é cromado.
Pedaleira avançada (à esquerda): item indispensável numa custom. Aqui, não foi necessário alongar os comandos até a pedaleira, como em alguns modelos, aqui o freio e as marchas são acionados com o calcanhar.
Agora sim eu poderia me lançar à parte mais ousada do meu
projeto: melhorar o desempenho do motor em seu limite.
CONTINUA...
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